Setembroo/2023: Psicologia/Neurociência

 

Sentir vem antes de Pensar e de Agir

Temos mais que 5 sentidos
Exterocepção, Interocepção e Propiocepção

 

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Enquanto lê este informe, atente para sua postura e expressão facial. Você está ereto, curvado, relaxado, tenso? Seu rosto irradia alegria e excitação?

 

A postura e a expressão facial compõem nossa Expressão Corporal. O cérebro responde à Expressão Corporal, como explica a neurocientista espanhola Nazareth Castellanos, pesquisadora do Laboratório Nirakara-Lab e professora da Universidade Complutense de Madri, na Espanha.

 

"Se faço uma cara de raiva, o cérebro interpreta que essa cara é típica de raiva e, portanto, ativa os mecanismos de raiva".

 

"Quando o corpo está em uma postura típica de tristeza, o cérebro começa a ativar mecanismos neurais típicos da tristeza".

 

O cérebro interage com o resto do corpo de muito mais formas do que se pensava anteriormente. "Não temos apenas cinco sentidos —mas, sim, sete".

 

Neste informe abordamos os sentidos que sinalizam o que está acontecendo no nosso mundo interno, também chamado muitas vezes de emoções e sentimentos. O que sentimos comanda a percepção da realidade e o modo como fazemos ciência. Nos baseamos na entrevista de Castellanos à BBC News Mundo. O texto contém edições e recortes da sua entrevista, e adições voltadas ao nosso propósito psicoterapêutico.

 

Temos mais que 5 sentidos

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“Os cinco sentidos mais conhecidos
—olfato, visão, audição, tato e paladar—
são os menos importantes para o cérebro.”

 

A neurociência já reconhece que temos sete sentidos.

 

Olfato, visão, audição, tato e paladar são os sentidos da exterocepção. Por meio deles percebemos o mundo do exterior. Porque a ciência se interessou mais por estudar a relação do ser humano com o mundo exterior, percebeu há pouco tempo que precisa expandir seu interesse incluindo a relação humana com seu mundo interno. Para nós, psicólogos, isso é relevante pois assim a ciência confirma que a percepção da realidade depende do que sentimos, do nosso estado de humor.

 

“O sentido mais importante é a interocepção”.

 

O sentido interocepção envia informação ao cérebro sobre o que acontece dentro do nosso organismo, sobre o mundo interno: informação sobre o que está acontecendo dentro dos órgãos, como coração, pulmão, estômago e intestinos. É o sentido número um porque o cérebro lhe dá mais importância, é sua prioridade.

 

O segundo sentido mais importante é a propriocepção.

 

“O número dois em prioridade é o sentido da propriocepção, que responde pela informação que chega ao cérebro sobre como está o corpo por fora, a postura, os gestos e as sensações que temos por todo o corpo.”

 

O sentido da propriocepção envia informação ao cérebro sobre as sensações. Sentimos uma explosão na barriga quando estamos com raiva, um frio na barriga quanto estamos com medo, um nó na garganta quando estamos tristes ou com vontade de chorar, os olhos pesados quando estamos cansados.

 

 

Sensações e Expressão Corporal
definem a percepção da realidade

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Recentemente a ciência, em especial a Neurociência, incluiu a interocepção e a propriocepção em seus métodos científicos. Com isso o interesse científico inclui, além da relação humana com o mundo exterior, a relação humana com o mundo interior: sensações, emoções, sentimentos, estado de humor, transtornos psicológicos. Não é possível fazer ciência de boa qualidade sem considerar que o cientista, além de utilizar sua aprimorada inteligência, é afetado pelo que sente.

 

“Já era conhecido que o cérebro precisa saber como está todo o corpo, mas antes se pensava que era uma informação passiva, a mudança agora é que isso é um sentido. Ou seja, um sentido é aquela informação que o cérebro recebe e à qual deve responder. Dependendo do que está acontecendo, o cérebro tem que agir de uma forma ou de outra, e essa é a grande mudança.”

 

O cérebro atribui uma importância tremenda ao que acontece no rosto. Por exemplo, foi observado que as pessoas que franzem a testa — e isso é algo que fazemos muito com celulares que têm telas pequenas — estão ativando uma área relacionada à amígdala, uma parte do cérebro que está mais envolvida no processamento das emoções. Quando eu franzo a testa, estou ativando minha amígdala, portanto, se surgir uma situação estressante, vou ficar mais estimulado, vou reagir mais, porque já tenho essa área preparada.

 

Além da musculatura ao redor dos olhos, a segunda parte mais importante do rosto para o cérebro é a boca. O poder da boca é impressionante. Um estudo mostrou que, ao simular um sorriso segurando uma caneta entre os dentes, mas sem sorrir de fato, via-se nas fotos mostradas que as pessoas pareciam mais simpáticas. Porém, quando tinham a caneta entre os lábios, simulando uma cara de raiva, as mesmas imagens não pareciam tão agradáveis.

 

Outros estudos mostram que quando vemos pessoas sorridentes somos mais criativos, nossa capacidade cognitiva aumenta. A resposta neural diante de um rosto sorridente é muito mais forte do que diante de um rosto que não sorri ou uma cara emburrada. O poder de um sorriso é enorme e o cérebro dedica um grande número de neurônios ao rosto.

 

A propriocepção, que é a informação que chega ao cérebro sobre como está nosso corpo e especificamente nosso rosto, é uma informação à qual o cérebro deve reagir. Se estamos tristes, se ficamos com raiva ou se estamos felizes, o rosto reflete isso. Se estamos com uma cara de raiva, o cérebro ativa mecanismos de raiva. Se a cara é de tranquilidade, ativa mecanismos de tranquilidade.
 

O cérebro sempre busca o que se chama de congruência mente-corpo.

 

Expressão facial

um recurso fundamental que nós temos

 

“ ... O que acontece se eu estiver triste, com raiva ou estressada e começar a fazer uma cara relaxada? A princípio, o cérebro diz "isso não bate, ela está nervosa, mas está com a cara relaxada".

 

E então começa a gerar algo chamado migração do estado de espírito. O cérebro diz: "tudo bem, então vou tentar combinar o estado de espírito com o rosto". ... “

 

Uso do Celular e do Laptop

Corpo curvado é associado à tristeza

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O uso de celulares e laptops modifica a postura. Se não estivermos atentos, ficamos com o corpo curvado.


Há pouco tempo, a neurociência descobriu que o cérebro tem uma área que se dedica a “ler” a postura do corpo. O cérebro associa a postura corporal a estados emocionais. Corpo curvado é característico da tristeza.

 

A postura corporal - relaxada, tensionada ou curvada - afeta a percepção emocional.

 

Estudos mostram que, quando estamos tristes, não somos tão ágeis intelectualmente e nos concentramos mais no lado negativo da realidade. Quando o corpo está curvado o cérebro ativa mecanismos neurais típicos da tristeza.

 

Na psicoterapia corporal estimulamos a atenção dos pacientes para sua postura corporal. Dizemos que é preciso ter consciência corporal, estar atento aos sinais do corpo e à postura corporal. Assim, ao evitarmos a postura curvada, em períodos prolongados de uso do celular e do laptop, evitamos sinalizar tristeza para o cérebro e melhoramos a eficácia e eficiência do raciocínio e da memória.

 

Estudos também mostram que grande parte da população tem uma consciência corporal muito baixa. As pessoas dizem que nunca pararam para observar o próprio corpo.

 

Toda emoção é sentida numa parte do corpo; emoções sem corpo seriam apenas uma ideia, como um registro gravado na memória do computador, que lá está sem gerar qualquer ação ou reação. Ter consciência da parte do corpo associada à emoção sentida é um bom começo para desenvolvermos a consciência corporal e utilizá-la como recurso para lidar melhor com as emoções.

 

Neste instante, ...
Que sensações corporais você percebe?

Sente alguma emoção?
Em que parte do corpo a emoção se manifesta?

Como você reage ao que está sentindo?

Qual é a relação entre esta emoção e

maneira como você está lendo este informe?

 

Quando estamos afetados por uma emoção, seja ela qual for, se pararmos neste momento e desviarmos a atenção para as sensações do corpo, isso nos trará um grande alívio. A depender apenas do corpo, a emoção gera um movimento, porém, o comando do movimento que ela demanda é mediado pelas regras morais, memórias, desejos e intenções. Assim, muitas vezes o movimento é contido. Para conter o movimento contraímos a musculatura, e assim deixamos de expressar o que sentimos. O corpo fica carregado e uma parte considerável da nossa energia é consumida neste processo, e também para evitar que a emoção escape em outro momento.

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É o corpo que nos coloca no “aqui e agora”. Se estamos diante de uma situação complexa, se há emoções envolvidas e se nem sequer sabemos onde estamos ou que emoção estamos tendo, é mais difícil tomar boas decisões.

 

 

A importância da respiração

 

A postura e a respiração estão intimamente relacionadas. Cuidar da postura é cuidar da respiração e vice-versa. A respiração influencia a memória, a atenção e a maneira como lidamos com as emoções. Para que a vida fique melhor, antes de mais nada, “reespiiiree”.

 

Estudos mostram que a respiração pelo nariz melhora a atividade cerebral. Mostram também que a respiração lenta tem poder analgésico. Para as emoções, o importante é que o tempo que levamos para expirar seja maior que o tempo que levamos para inspirar.

 

E nas nossas sessões de Psicoterapia ...

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Estimulamos os pacientes a considerar o que nos apresenta Iaci Malta, em "Emoções e Sentimentos segundo António Damásio".

 

Seguem recortes e edições do texto original

 

“ ...

 

Para Reich e seu seguidor Alexander Lowen, a expressão das emoções é um fator primordial para a manutenção da saúde psíquica e física do ser humano. Para ambos a repressão das emoções constitui um mecanismo de defesa que visa proteger o indivíduo contra experiências emocionais dolorosas e ameaçadoras, mas pode simplesmente resultar na perda de vitalidade.

 

Em particular os exercícios corporais criados por Lowen para compor a técnica corporal da Análise Bioenergética têm o objetivo de desfazer as contrações musculares que impedem – ou dificultam - a expressão das emoções.

 

...

 

A partir dessas reflexões comecei a me referir não apenas à importância de expressar as emoções, mas também à importância de termos consciência das emoções que nos acometem; à importância de nos liberarmos, nos autorizarmos a sentir essas emoções sem julgamentos de certo e errado.

 

Comecei a adotar a convicção de que não podemos realmente reprimir as emoções, mas sim apenas ter a consciência de suas ocorrências. Não podemos controlar a ocorrência de emoções além da possibilidade de evitarmos estímulos que as provoquem. Uma vez atingido pelo estímulo, nosso organismo reagirá de acordo com uma programação biológica: com raiva se frustrado, com medo se ameaçado, com tristeza se vivemos uma perda, com alegria se satisfeito.

 

Podemos não ter consciência dessas reações, de alguma forma não fazer contato com os eventos corporais que estão acontecendo. Na raiva por exemplo, os vasos sanguíneos periféricos se dilatam esquentando o corpo, ficamos ‘vermelhos” (daí a expressão “vermelho de raiva”). No medo, ao contrário, esses vasos se contraem, ficamos mais “frios” e pálidos (daí a expressão “branco de medo”). Assim, adotei a forma de descrever o mecanismo de defesa mais primitivo como supressão da consciência da ocorrência de emoções potencialmente vividas como ameaçadoras.

 

Nessa formulação, a importância da expressão das emoções é substituída pela importância da percepção (ou da liberação da percepção) das emoções que nos acometem independentemente de nossa vontade e do nosso controle.

Em bioenergética nos referimos a essa conscientização como estar em contato com o próprio corpo, ou seja, viver num estado de maior integração corpo-mente.

 

Emoções são reações do organismo vivo, programadas biologicamente, cuja ocorrência não podemos controlar e que, portanto, não são nem certas nem erradas.


... “

 

Referência bibliográfica:

 

Temos 7 sentidos e os 5 mais conhecidos são os menos importantes

Entrevista com a neurocientista espanhola Nazareth Castellanos,
que estuda o que a ciência tem chamado de 'interocepção' e 'propriocepção

 

O erro de Descartes
Damásio, António R.; Tradução: Lucinda Maria dos Santos Silva; Ed. Editora Econômica; 2012

 

Emoções e Sentimentos segundo António Damásio

Transcrição do texto de Iaci Malta, escrito em Agosto de 2009

 

Percepção - Mundos: Real, Digitalizado e Virtual ... e a Convivência de Boa Qualidade?

 

A palavra vem depois da Expressão Corporal

 

"Sinto, logo Existo" e "Existo, logo Penso" - Comunidade e Causalidade