Abril/2021
Psicologia
Como eu seria,
se tivesse feito outras escolhas?
“ ... Seria melhor ficar com Tereza ou continuar sozinho?
Nunca se pode saber o que se deve querer, pois só se tem uma vida e não se pode nem compará-la com as vidas anteriores, nem corrigi-la nas vidas posteriores.
Não existe meio de verificar qual é a decisão acertada, pois não existe termo de comparação. Tudo é vivido pela primeira vez e sem preparação. Como se um ator entrasse em cena sem nunca ter ensaiado.
Mas o que pode valer a vida, se o primeiro ensaio da vida já é a própria vida? É isso que leva a vida a parecer sempre um esboço. No entanto, mesmo esboço não é a palavra certa, pois um esboço é sempre o projeto de alguma coisa, a preparação de um quadro, ao passo que o esboço que é a nossa vida não é o esboço de nada ... “
"A insustentável leveza do ser”
Recortes do livro de Milan Kundera
O processo da Escolha
Muito me encantam as sessões com os adolescentes: a criança vai dando lugar ao adulto que começa a se apresentar. Nesta fase há uma pressão enorme na escolha do que o deveria fazer o enigmático adulto que vem chegando, em especial, qual seria sua opção profissional. Assim, trabalhando o tema das escolhas da vida, Kenny, meu paciente de 17 anos, e eu analisávamos alternativas para suas escolhas. Ele estava empolgado com a leitura de Kundera, “A insustentável leveza do ser”. A recordação do livro remeteu-me à minha própria adolescência e conversamos sobre algumas ideias, que procurei recuperar da memória, com a difícil tarefa de encontrar algo guardado há mais ou menos 50 anos. Depois desta sessão, resolvi fazer a releitura e logo de início, Kundera mostrou-me um caminho para tratar o tema da escolha, que costumo associar à responsabilidade, à ansiedade, ao pensamento obsessivo, à avaliação de riscos e à procrastinação. Daí a participação da Tereza neste informe.
Lembrei-me também do pai de adolescentes que fui, da reação que provocava em meus filhos – inúmeras vezes – quando eu lhes dizia que era deles a tarefa de escolher e que também seria deles a responsabilidade de lidar com as consequências advindas. Lembro-me claramente da expressão corporal deles - mistura de raiva, medo, desapontamento e gratidão. Acredito que a persistência em falar sobre responsabilidade foi contribuição relevante na composição dos adultos em que se transformaram.
Voltando às sessões, o tema da escolha é comum aos pacientes de todas as idades.
A consciência é a principal instância do processo de escolha? Ou seriam o inconsciente, o corpo e as emoções? Costumo considerar que todas as instâncias atuam no processo de escolha.
Você é livre para fazer as suas escolhas, mas é prisioneiro das consequências.
Pablo Neruda
Escolha, consciência, inconsciência, corpo, emoções e regras morais
Com base no Princípio do Prazer, nosso corpo escolhe para obter prazer e alegria. E assim, para tudo que é excitante, o corpo nos cobra a realização do desejo, preferencialmente no momento em que a excitação aparece. É aproveitar a oportunidade que se apresenta, sem considerar as consequências, como fazem tão bem as crianças não reprimidas demais.
Outro princípio nos cobra responsabilidade, ética e preservação do bem comum. O Princípio da Realidade dá pouca atenção ao nosso corpo e muita atenção às regras morais e legais. E lá se vai o prazer e a alegria; e lá vem chatice personificada na expressão do adolescente que quer se esquivar do adulto em que está se transformando.
Ao escolher, muitas vezes buscamos controle, ou melhor, nos iludimos com esta ideia. Esta ilusão nos faz acreditar que avaliamos todos os riscos e previmos todas as consequências possíveis. Porém, a natureza reina e torna o controle inviável. O que devemos é fazer o melhor possível: a melhor avaliação de riscos; buscar conselhos de quem já fez escolhas semelhantes; consultar quem conhece bem o assunto; considerar que outras alternativas não foram percebidas; “pensar fora da caixa” e levar em conta nossa intuição.
Pensar demais, procrastinar, desistir, adiar e deixar que outros decidam por nós são escolhas que frequentemente diminuem ou eliminam o prazer e a alegria.
Há escolhas difíceis de fazer, processos de escolha que nos trazem mal estar e que comprometem nossa saúde. Costumo citar o que dizem os especialistas em planejamento: “devemos investir 5% da nossa energia em planejamento – escolher o que fazer - e 95% da nossa energia na execução do plano – na ocupação em si”. Dizendo de outra forma, é melhor se ocupar do que se preocupar.
A dificuldade em escolher pode estar associada à ansiedade. Neste contexto a ansiedade constitui o medo dos perigos imaginados, não o medo de perigos de fato. A ansiedade nos traz pensamentos obsessivos e paralisantes, resultado de processos de escolha em que imaginamos que os danos serão maiores que o prazer e a alegria que tanto buscamos, não importando a alternativa escolhida. Além disso, se for muito intensa, a ansiedade compromete nosso desempenho na vida, trazendo sintomas como taquicardia, sudorese, respiração curta, insônia e também pode ser acompanhada do estado depressivo.
Escolher nos coloca em algum lugar entre a ponderação e a impulsividade. Definir a escolha nos coloca num caminho particular. Não definir a escolha nos coloca no mundo das fantasias e do "deixa a vida me levar", cantado por Zeca Pagodinho.
Para melhorar o nosso processo de escolha, podemos desenvolver a parcimônia, a paciência, o equilíbrio, a sensatez, a empatia, a maturidade, o discernimento, a sabedoria, a razão, a inteligência, e assim chegarmos a escolhas criativas, assertivas e em sintonia com os nossos sentimentos e nossas relações.
A responsabilidade da escolha segundo Schopenhauer
"A liberdade nos coloca em confronto com as escolhas e com nosso ser interior.
Quando escolhemos alguma coisa, também devemos assumir a responsabilidade por esta decisão. Feita a escolha, não podemos mais escapar dela. Depois da escolha, depois de saber o que decidimos, é que ficamos sabendo quem de fato nós somos.
Cada escolha toma uma possibilidade e abandona outra. Mais precisamente, a tomada de decisão significa encerrar um universo inteiro de possibilidades. Todo “Sim” está sempre encaixado à firme negação de seu oposto e assim nos assevera o conhecimento de nós mesmos."
"Schopenhauer e os anos mais selvagens da filosofia"
livro de de Rudger Safranski
Se em um dia de tristezas, tiveres de escolher entre o mundo e o amor, escolhas o amor, e com ele conquiste o mundo.
Albert Einstein
Sobre o Tempo e as Escolha
O Ansioso escolhe viver no Futuro, o Deprimido escolhe viver no Passado e o Saudável escolhe viver no Presente.
Referência bibliográfica:
A Insustentável Leveza do Ser
Kundera, Milan, 1929; tradução Teresa Bulhões Carvalho da Fonseca; 1a. Ed - São Paulo: Companhia das Letras, 2008
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