Jaimildo Vieira - Evoluir é preciso? - Nada é Permanente, Exceto a Mudança

Abordamos o Desenvolvimento Humano em outros informes. Citamos sumariamente as ideias de Piaget, Wallon e Freud. O objetivo foi colaborar com os pais e cuidadores para que sejam “suficientemente bons” no seu trabalho de acolher, proteger, prover e orientar a evolução de bebês, crianças e adolescentes, e também dos jovens adultos e idosos.

Tratamos aqui da evolução do adulto, que tem menor dependência dos cuidadores.

Como evoluir com bem estar, prazer e alegria? Como lidar adequadamente com eventos de sofrimento e desconforto? Como estar preparado para enfrentar os prováveis perigos que nos espreitam?

Ter um Propósito de Vida é fundamental. Ele é a finalidade do processo de evolução. É o "para que" e não o "por que" da nossa existência.

Buscamos estar num ambiente estável e seguro, a Zona de Conforto. Ficar nela além do tempo necessário é uma escolha ruim. Ali estagnamos, deixamos de nos preparar para a vida e nos tornamos mais dependentes de outras pessoas.

E quando os perigos e perdas aparecem ...

Crescer dói? Mudar assusta? Como evoluir sem medo?

É bem provável que você já tenha ouvido dizer que “não há crescimento sem dor” ou que “aprendemos com nossos erros”. Será mesmo que tem que ser sempre assim?

Mudar é lidar com o desconhecido, traz o medo. Medo é a emoção primária mais importante. É o medo que zela por nossa sobrevivência, nos alertando dos perigos de fato, aqueles percebidos pelo nosso sistema sensorial. Diferente da ansiedade, que se vale de idéias fantasiosas de perigo, o medo é nosso grande aliado. Será mesmo que precisamos nos assustar? Ou deveríamos ter recursos para lidar com os perigos, enfrentando ou fugindo deles?

Uma vez concebidos, crescemos e evoluímos. No útero materno, nossas células se multiplicam até que nosso tamanho não caiba mais nele. O que era confortável e seguro passa a ser pequeno demais para nós. “Temos que nascer!”. Nascidos, procuramos em vão um novo Shangri-lá.

“Para crescer de verdade precisamos ir para além dos muros que construímos em torno das nossas emoções.” (Gruber, 2022). Freud chamou esses muros de Mecanismos de Defesa, um equivalente psicológico ao nosso sistema imunológico. Sempre atentos às emoções que não queremos sentir, em especial o medo, os Mecanismos de Defesa interferem no processo de percepção, tentando excluir as emoções ruins que os perigos nos trazem e fazendo-nos acreditar que a vida deveria ter apenas eventos bons. Reprimem as sensações ruins e as colocam num lugar muito especial, que Freud chamou de inconsciente. Sem nos darmos conta, muitas emoções ficam lá guardadas, a espera de oportunidade de expressão. Daí a necessidade primária de expressarmos tudo que sentimos, de bom e de mau. De forma ambivalente os Mecanismos de Defesa nos protegem e também atrapalham nossa evolução.

Se não percebermos e se não soubermos lidar com os perigos da vida, seremos sempre dependentes da proteção e cuidado de outrem, como quando éramos crianças. O processo de evolução nos prepara para os perigos da vida.

Trouxe o corpo neste contexto, pois ele é a forma de expressão do nosso ser, da nossa alma. Inexoravelmente, nosso corpo está em permanente mudança. Podemos agir como criança ou como adolescente, mas fazer isso aos 30, 40, 50 anos ... seria como viver na Shangri-lá de Hilton, no imaginado horizonte perdido.

A inquietude de Calvin parece precoce. Talvez os Mecanismos de Defesa dele estejam em formação e ainda não tão atuantes.

Se os grandes pensadores não chegaram a respostas convincentes sobre as Questões Existenciais, é bem razoável pensar que cada um de nós deveria definir um propósito para sua própria vida. A vida é o primeiro presente que recebemos e dar um propósito a ela é relevante e viável.

É o Propósito de Vida que nos mantém motivados a evoluir e ser cada vez mais a melhor versão possível de nós mesmos, com saúde, amor, alegria, sabedoria e prosperidade.

Heráclito nos traz a ideia de que tudo está em constante movimento e transformação. É especialmente conhecido como o filósofo do devir, o “vir-a-ser”, que significa a mudança perpétua.

“O devir é caracterizado por um contínuo fluir das coisas de um contrário ao outro"; “as coisas frias se aquecem, as coisas quentes se esfriam, as coisas úmidas secam, as coisas secas umedecem”; “o jovem envelhece, o vivo morre, e assim por diante.” Afirmava que no mundo “tudo flui”, A realidade não é estática, não há substância fixa, mas tudo encontra-se em constante movimento.

Para Heráclito, o mundo é dinâmico e está sempre em fluxo. Tudo muda e transmuta. E neste dinamismo, tudo se alterna constantemente entre polos, e essa oscilação entre contrários é identificada como sendo responsável pelo equilíbrio e unidade das coisas.

“O devir é o continuo conflito dos contrários que se alternam, é uma perene luta de um contra o outro ... ”. É neste confronto do devir que se origina a harmonia universal, pois para Heráclito, identificar a oposição existente na natureza, significa perceber a unidade que ela possui.

“Um caminho: subida, descida, um e o mesmo”.

“São o mesmo o princípio e o fim de uma circunferência”.

“A doença faz da saúde algo aprazível e bom”.

A Zona de Conforto é um lugar estável, com perigos que não nos assustam. Sentimo-nos seguros.

A Zona do Medo é um lugar onde o perigo nos espreita. Sentimo-nos mal e inseguros. Os perigos nem sempre causam danos ou traumas. A Zona do Medo exige que enfrentemos o perigo, e para fazer isso precisamos estar preparados. Se não fugirmos de volta para a Zona de Conforto teremos mais chance de evoluír.

A Zona de Aprendizagem é um lugar onde adquirimos novas capacidades e habilidades. É a zona de preparação para enfrentarmos os perigos e imprevistos da vida. Aprendemos também com apoio, suporte e proteção dos nossos companheiros: família, professores, amigos, consultores, entre outros.

A Zona de Crescimento é o lugar de realização pessoal, de saúde e de qualidade de vida.

Parece muito bom viver um processo de crescimento contínuo. Entretanto, viver não é simples assim.

Muitas vezes e pelas mais variadas razões, deixamos a Zona de Crescimento e passamos períodos na Zona de Conforto (ócio, férias, preguiça, procrastinação), na Zona de Medo (doenças, crises financeiras, ameaças) e na Zona de Aprendizagem (capacitação e treinamento para realização de novas atividades).

Como Heráclito nos diz, mesmo que queiramos estar na zona de conforto o tempo todo, isso não é possível: “nada permanece, exceto a mudança”.

Parece bem razoável perceber que a dinâmica da vida faz com que frequentemos todas as zonas (conforto, medo, aprendizagem e crescimento).

Embora queiramos passar mais tempo na zona de conforto, nossas experiências de vida mostram que a sabedoria é fruto da nossa escolha de enfrentar os infortúnios. Passado o infortúnio, percebemos que as vivências não foram tão ruins assim. Muitas vezes nos proporcionaram um melhor preparo para lidar com as vicissitudes da vida.

Voltando ao ponto da paciente: sim, aproveite e desfrute da Zona do Conforto! Lembre-se de Heráclito, consciente de que devemos evoluir para estarmos preparados para as outras zonas.