Novembro/2024  Psicologia/Era Digital

 

Mais conversas e
Menos tempo nas telinhas

 

e sua relação com TOC, TDAH, TOD e TEA

 

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Mais conversa e menos tempo na telinha é um dos temas mais frequentes nas nossas sessões de psicoterapia. É raro não abordarmos as mudanças na forma de nos relacionarmos, “cada vez menos humanas e cada vez mais robotizada”.

 

Precisamos falar mais deste tema. Conversar sobre nossa vida digital é uma forma de tratamento da saúde mental.

 

Compartilho neste informe a entrevista que Nara da Silva concedeu ao SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), em abril/2024, cujo tema foi a Saúde Mental na Era Digital.

 

“Não só as crianças, mas todos nós estamos vulneráveis aos problemas de saúde mental, causados pela uso inadequado das tecnologias digitais.”

 

 

Saúde mental na Era Digital

 

Recortes, adições e edições da entrevista com Nara Helena Lopes Pereira da Silva, professora de Psicologia Online, no programa de pós-graduação do Instituto de Psicologia da USP.

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Excesso de informação e consumo ilimitado de mídias sociais e das tecnologias digitais pode prejudicar a saúde mental de crianças e adultos.

A maior parte do mundo está conectada à Internet, diariamente, boa parte do dia todo. É difícil imaginar nossa vida desconectada ou desprovida de smartphones, tablets, computadores, mídias sociais, apps ... Junto com este  amplo acesso também vem uma quantidade de informações impossível de assimilar: algumas boas, outras nem tanto e muitas falsas. E esse excesso de informação – a chamada “infodemia” – combinado à falta de mecanismos efetivos de controle de qualidade de conteúdo e de acesso colocam em risco a saúde mental dos usuários.

Nos últimos anos, o uso excessivo de tecnologias digitais e de redes sociais tem sido diretamente associado a um aumento do número de casos de transtornos mentais como depressão, ansiedade e estresse. Um dos efeitos mais óbvios da era digital na saúde é a ascensão das mídias sociais. Essas plataformas permitem a conexão entre pessoas de todo o mundo, mas também podem levar a sentimentos de solidão e isolamento.

Casal no restaurante - vendo celular.png

Essa interação excessiva com o universo online vem trazendo algumas mudanças na forma de nos relacionarmos com outras pessoas e no grau de desenvolvimento individual e social que podemos atingir.

 

Essas mudanças têm agravado ou provocado vários quadros de problemas psicológicos e afetam a socialização, impactando aspectos como empatia, tolerância e aceitação.

Embora haja uma preocupação maior com crianças e adolescentes, esta questão deve ser considerada para qualquer faixa etária.

 

Nos consultórios psicoterapêuticos, há uma queixa frequente dos adolescentes, que relatam que os pais não estão disponíveis para escutá-los, por priorizarem as interações diversas no mundo digital.

 

A pandemia Covid-19 tornou o acesso demasiado ao mundo digital uma coisa “natural”.

 

Acordamos com o celular na mão e passamos o dia todo atentos às notificações que ele nos traz. Sem controle e nem monitoramento, acreditamos que temos que verificar, responder, compartilhar, bloquear ... todas as notificações. Esse comportamento gera falta de foco e de memória (inclusive espacial), e também altera a dinâmica psicológica.

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Na internet abrimos diversas janelas e queremos olhar tudo “simultaneamente”. Quando lemos um livro, o processo é linear, tomamos o devido tempo.

 

As crianças estão mudando o seu modo de aprender. Não há tempo para introspecção, formar de opinião ou criar individualmente o próprio espaço e suas próprias ideias e conceitos.

 

Há pouco tempo, em termos de diagnóstico psiquiátrico, foi inserido no DSM-5, como Condiçõs para Estudos Posteriores, o  Transtorno de Vício em Jogos. Porém, ainda não temos nada sobre o vício tecnológico: rede social, likes, busca e resposta imediata. O Vício Tecnológico gera intolerância nos relacionamentos sociais, falta de empatia, intolerância com o diferente. As bolhas da internet reafirmam o que acreditamos.

 

... “a internet está dizendo que eu estou certo ...”, enquanto nas relações humanas as coisas não são assim. Relações humanas implcam em conversa e discussão, respeito às diferenças, e tudo olho-no-olh. E como fica a alteridade?

 

A vivência no mundo digital vem sendo considerada uma razão relevante para a falta de contato entre os adolescentes, em especial, os contatos corpo a corpo. Alguns adolescentes não querem nem sair de casa.

Há uma mudança na sua consciência individual e social.

 

Muitas vezes não percebemos como nos posicionamos e como não notamos o outro que está no nosso ambiente.

Estar conectado nos tira o tempo sagrado do ócio, da introspecção, do tédio, de ler um livro. Nos tira o tempo de criar, de desejar e de sonhar por nós mesmos. E há que se destacar que as notificações de ofertas - consumismo - criam o desejo artificial e impessoal.

 

"Nós estamos viciados, dependentes da internet para muitas coisas que fazemos. E quando temos uma dependência, é difícil que um dependente tenha a capacidade de tratar outro dependente."

 

Rede social lá em casa é outra coisa.jpg

Pesquisa TIC Domicílios 2023

Acesso excessivo e inapropriado à internet e sua relação com a saúde 

 

Segundo a pesquisa TIC Domicilios 2023, o Brasil é o segundo pais que mais acessa a internet, com média de 10 horas de uso da internet por dia. Isto é uma mudança e uma patologização geral de todos.

 

O fato de não termos um diagnóstico CID ou DSM definido para transtornos causados pelo uso inadequado das tecnologias digitais, faz com que estas questões se utilizem de outros rótulos como TOC, TDAH, TEA e TOD.

 

TOC Transtorno Obsessivo Compulsivo
TDAH Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade

TEA Transtorno do Espectro Autista

TOD Transtorno Opositor Desafiador

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Letramento Digital

 

“Deixar seu filho (criança ou adolescente) solto na internet, é como deixá-lo numa praça pública de uma cidade que você não conhece. A internet é um mundo com riscos psicológicos e físicos.”  ... Nara da Silva

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O Letramento Digital propõe o uso adequado e consciente da internet. Pais e escolas devem se envolver com este tema. É relevante que as escolas tenham um programa voltado ao Letramento Digital.

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Psicoeducação e Higiene Digital

 

A Psicoeducação e a Higiene Digital visam a “justa medida” do uso das tecnologias digitais. São um tratamento, não apenas uma orientação.

 

Já é comum se falar em “detox” digital, associando a este termo um período de tempo sem contato com o mundo digital, seja por celular, tablet ou computador.

Há que se evitar excessos de 2.jpg
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Há que se considerar a Vulnerabilidade Digital associada às pessoas ingênuas, que não conhecem e não estão preparadas para o uso adequado das tecnologias digitais. Tornam-se sujeitas à perda de privacidade, golpes cibernéticos, assédios morais e sexuais. Isso ocorre em especial com as crianças.

 

Vivemos numa sociedade cada vez menos humana, cada vez mais robótica, que está perdendo esferas humanas como desejo e reflexão sobre as coisas.

 

“Não só as crianças, mas todos nós estamos vulneráveis aos problemas de saúde mental, causados pelo uso inadequado das tecnologias digitais.”

 

 

E nas sessões de psicoterapia ...

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O Letramento, a Psicoeducação e a Higiene Digitais fazem parte do processo psicoterapêutico.

 

Os temas mais comuns são:

 

Uso excessivo do acesso à internet: redes sociais, aplicativos de acesso a vídeos de todos os tipos, dificuldade de limitar o tempo de acesso/resposta/bloqueio a posts e notificações diversas.

 

Psicoeducação: os efeitos do uso inadequado das tecnologias digitais.

 

Monitoração e controle do conteúdo digital acessado.

 

Consequências do aprendizado a partir de registros digitais ao invés da experiência/vivência: mundo DIGITAL versus mundo REAL com implicação na formação de ideias, conceitos e preconceitos, valores, ideologias, tipos de relacionamentos ...

 

Recomendo também a leitura das Condições para Estudos Posteriores sobre o Transtorno do Jogo pela Internet, propostas no DSM -5, considerando que o que está apontado para o “Jogo pela Internet” deverá ser ampliado para o uso das tecnologias digitais, com foco não apenas nas crianças e adolescentes, mas também nos adultos de todas as idades. Destaco a associação do uso não saudável de tecnologias digitais aos transtornos TOC, TDAH, TOD e TEA.

Sugestão de Filme

O mundo depois de nós 1.jpg

Para refletir sobre a Vulnerabilidade Digital

 

Disponível na Netflix em 5/12/24.

Se assinante, click aqui se quiser assisti-lo.

 

Referência bibliográfica:

 

Saúde Mental na Era Digital

Entrevista de Nara Helena Lopes Pereira da Silva, professora de psicologia online no programa de pós-graduação do Instituto de Psicologia da USP, concedida ao SBPC, para o podcast Ciência & Cultura, no dia 17 de dezembro de 2023 

 

Pesquisa Tic Domicilios - 2023

Pesquisa sobre o Uso das Tecnologias de Informação e Comunicação nos Domicílios Brasileiros

 

O Mundo Depois de Nós

As férias de uma família numa casa luxuosa sofrem uma reviravolta quando um ciberataque afeta todos os dispositivos e duas pessoas estranhas batem à porta. Elenco: Julia roberts, Mahershala All, Ethan Howke

Filme disponível na Netflix em 28/11/2024

 

Justa Medida

 Informe de Setembro/2024: Justa MedidaA falta, a prudência ou o excesso ?

“A virtude só pode ser alcançada pela prudência, a ponderação e deliberação sobre a justa medida, a mediana entre os vícios por omissão ou por excesso.”      Sobre a Ética Aristotélica  

 

Sua Atenção e suas Escolhas 

 Informe de Fevereiro/2023: Sua Atenção e suas Escolhas

Influenciadores e Comunidades Digitais - Marketing de Influência, Marketing Digital e Consumismo

 

Percepção - Mundos: Real, Digitalizado e Virtual ... e a Convivência de Boa Qualidade?

 Informe de Maio/2022: Percepção - Mundos: Real, Digitalizado e Virtual - ... e a Convivência de Boa Qualidade?

 

Transtorno do Jogo pela Internet

Transcrição dos Critérios Propostos no DSM-5

 

DSM-5

Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais [recurso eletrônico] : DSM-5 / [American Psychiatric Association ; tradução: Maria Inês Corrêa Nascimento ... et al.] ; revisão técnica: Aristides Volpato Cordioli ... [et al.]. – 5. ed. – Dados eletrônicos. – Porto Alegre : Artmed, 2014.
Editado também como livro impresso em 2014. ISBN 978-85-8271-089-0